Você já se perguntou: quando devo começar a falar de emoções com meu filho ou meus alunos? Será que eles entendem o que é estar triste, feliz, com medo ou bravo? Muitas vezes achamos que falar de emoções é algo “óbvio”, mas na verdade estamos diante de um processo complexo de desenvolvimento neurológico, social e afetivo.
Afinal, as crianças sabem o que são emoções?
Não exatamente. 👶 Um bebê já percebe desde cedo que o choro gera uma resposta: alguém aparece, oferece comida, carinho ou troca a fralda. Aos poucos, ele entende que seus gestos e expressões comunicam necessidades. Mas a compreensão e nomeação das emoções vai sendo construída na infância e adolescência.
Na primeira infância, a criança aprende emoções básicas (como alegria, tristeza, medo, raiva e surpresa). Conforme cresce, amplia esse repertório, incluindo emoções mais complexas, como frustração, vergonha, orgulho, culpa e empatia.
⭐ Por que devemos falar sobre emoções com as crianças?
Porque emoção, pensamento e comportamento estão interligados. As experiências que acumulamos formam um verdadeiro “software mental”, que guia nossas escolhas, hábitos e crenças. Quando não ensinamos a criança a reconhecer e lidar com suas emoções, ela pode:
- Ter dificuldades de autocontrole,
- Baixa tolerância à frustração,
- Explosões de choro ou birras constantes,
- Dificuldade em expressar sentimentos de forma saudável.
E aqui entra um ponto importante: crianças com autismo também passam por esse processo, mas de forma diferente. Muitas vezes a compreensão das emoções é mais abstrata e requer estratégias visuais, exemplos concretos e muita previsibilidade.
O desafio do “não”
Estudos da neurociência apontam que a palavra “não” é abstrata e difícil de decodificar no cérebro infantil, que está em plena formação. Quando dizemos:
- “Não corre!” → a criança processa primeiro “corre”.
- “Não grita!” → ela entende “grita”.
- “Não sobe na mesa!” → sobra “sobe na mesa”.
Ou seja, sem querer, reforçamos o comportamento que queremos evitar. Isso é ainda mais evidente nas crianças pequenas e em muitas crianças autistas, que precisam de comandos objetivos e diretos.
⭐ Como podemos mudar nossa forma de comunicar?
🔹 Substitua o “não” por orientações claras e práticas:
- Em vez de “não corra!”, diga: “caminhe, segure minha mão”.
- Em vez de “não grite!”, diga: “fale baixo, como se fosse um segredo”.
- Em vez de “não suba na mesa!”, diga: “sente-se na cadeira, por favor”.
🔹 Use previsibilidade:
As transições são difíceis para as crianças. Em vez de:
- “Acabou! Agora vai comer!”
Experimente: - “Daqui 15 minutos vamos guardar os brinquedos e almoçar, combinado?”
🔹 Explique o que vai acontecer:
- “Nós vamos ao mercado comprar 5 coisas e depois voltamos para casa para fazer o jantar.”
Isso dá segurança, clareza e sentido para a criança.
E as birras? Por que acontecem tanto?
A birra, ou descontrole emocional, acontece porque a criança ainda não tem maturidade cerebral para regular suas emoções. O choro, o grito e o se jogar no chão são formas primitivas de comunicação.
Além disso, se ela percebe que chorar traz recompensas (pais cedendo, mais atenção, mudança de regras), tende a repetir.
⭐ Como ajudar a criança a lidar com as emoções?
- Valide o que ela sente:
- “Eu entendo que você está triste porque o brinquedo quebrou. Isso realmente é chato.”
- Mostre que o sentimento passa:
- “Você caiu e doeu. Mas já está melhorando, daqui a pouco a dor vai embora.”
- Incentive a fala:
- “Você pode me contar o que está sentindo. Está bravo porque não conseguiu o que queria, certo?”
- Seja exemplo:
- As crianças aprendem muito mais com o que veem do que com o que ouvem. Se você grita para que ela não grite, a contradição fala mais alto.
Um ponto essencial: pais e professores também precisam cuidar de si
Muitas vezes estamos no piloto automático, repetindo padrões herdados. Mas podemos reaprender, adaptar nosso vocabulário e mudar a forma como nos comunicamos. Isso exige consciência, paciência e prática.
⭐ Recursos que podem ajudar no trabalho com emoções
Além das dicas de comunicação e exemplos práticos, alguns jogos e livros podem facilitar muito esse processo com as crianças — inclusive as bem pequenas, a partir de 2 anos:
🎲 Jogos e materiais lúdicos
- Cubo de emoções – ótimo para usar desde cedo.
- Nomeando as emoções – ajuda a ampliar o vocabulário emocional.
- Como me sinto – recurso divertido e prático.
- Quadro das emoções magnético – ideal para uso em casa ou na escola.
- Conjunto de emoções com boneco – excelente para crianças com autismo.
📚 Livros para explorar sentimentos
📖 Coleções especiais
💔 Livros para trabalhar o luto na infância
⭐ Para refletir
A criança está em construção. Cada palavra, gesto e emoção que compartilhamos com ela ajuda a formar a base da sua personalidade e do seu modo de se relacionar com o mundo. Ensinar emoções é ensinar humanidade.
📚 Fonte científica: Estudos em neurociência do desenvolvimento indicam que a negação é mais abstrata e de difícil compreensão para crianças pequenas e para pessoas com autismo. Um exemplo é o trabalho de Adele Diamond (2013), pesquisadora em neurociência cognitiva do desenvolvimento, que aborda como as funções executivas (memória de trabalho, controle inibitório e flexibilidade cognitiva) ainda estão em formação na infância.